17 de julho de 2011

Recortes de uma soma poderosa

Escuto o concerto transmitido por um dos inúmeros canais de televisão que há por aqui; abaixo um pouco a persiana, para me proteger da claridade em excesso que produz o verão europeu, e hoje comi bem mais tarde do que de costume. Há um artigo iniciado que preciso finalizar e estou aguardando o contato do fotógrafo que de mim fará um retrato. 


A lua cheia eu vi, semana passada; linda, repleta, sinceramente sendo no céu, sem estrelas, mas com os fogos de artifício da Fête Nationale, que com a lua dançavam na bonita noite do dia 14 de julho, data em que se comemora a queda da Bastilha e o início da Revolução Francesa. Para celebrar a data, além do show de fogos de artifício, os prédios públicos são envoltos nas cores da bandeira do País e há desfile cívico


Em Strasbourg, fui conferir a comemoração, que contou com o show de uma banda de rock, na Place de la Bourse. Músicas francesas dos anos 30, somadas as canções mais conhecidas de Michael Jackson, deram uma aura de baile à praça, onde estive com uma colega japonesa, que estava com seu marido francês, e uma colega da Mongólia, que levou sua filha. A um dado momento da noite, eu disse: "esta é uma festa internacional, amigos, olha só, somos cada um de um país diferente". Embarquei na antítese da festa nacional com presença internacional.

Os bares e restaurantes de Strasbourg estão bem cheios. O sol evoca a vida, a liberdade e faz um dengo na pele da gente. É verão na Europa e a animação toma conta de tudo e de todos. Meu domínio da língua francesa cresce. Ai, como é bom! Gosto disso e claro que quero muito mais. Minha bicicleta parece mais próxima dos cantinhos da cidade por onde passa, meus diálogos com quem sou na vida não cessam e investigo meu pensamento, insistentemente, para não deixar de transbordar o que tiver de ser, em mim, posto para fora.

Papéis, contas, compras, mercado, cartões postais, viagens, indicativos novos. Houve um sábado em que ajudamos um agricultor a colocar comida para suas ovelhas; no caminho, vimos uma macieira e a tocamos. Sensação tão curiosa e nova tivemos! À noite, dormimos na casa de uma amiga, numa floresta, e fizemos novas fotos, interagimos com um casal muito simpático; refiro-me ao português Abílio e à francesa Rosine, que fala também alemão. 



Eles nos serviram um belo jantar e não tenho dúvida de que estamos vivendo uma fase em que sonhos e realização são sinônimos. Resta-nos, então, sabermos guardar tudinho em nossa caixinha de belezas raras. É uma delícia esta emoção de estarmos rodando numa ciranda que aumenta, sempre.

Meus livros estão se somando em um percurso do qual pouco sei falar, mas estão aqui, comigo, seguros, orientando-me no manejo do tempo, alertando-me que eles precisam ser esgotados. As ruas, ah, as ruas, destas estou alimentada, nutrida, repleta de cada detalhezinho que consigo apreender... a cor de uma parede, o formato de um telhado, uma esquina com um violino pendurado. 



Um dia, caminho; noutro, pedalo; naquele outro, entro no táxi e, quando estou me preparando para descer do veículo, a emissora de rádio, que o motorista escolheu para ouvir justo na tarde daquela quarta-feira, resolve tocar nada mais, nada menos do que "Toda menina baiana", de Gilberto Gil. Senti esta maravilhosa canção como se ela tivesse sido colocada para mim e não deixei, é claro, de fazer uma festa bem baiana ali, aos pés da estação de trem principal de Strasbourg, de onde eu partia para Paris.


Estou sabendo ser, eu acredito. A França tem me levado a ganhos, experimentações, descobertas, novos rascunhos, desenhos de mim, que eu ainda não conhecia o traço.

3 comentários:

  1. 'o sol evoca a vida, a liberdade e faz um dengo na pele da gente. ' Achei essa parte linda, até chegar ao finalzinho do texto e me deparar com seu último parágrafo 'Estou sabendo ser, eu acredito. A França tem me levado a ganhos, experimentações, descobertas, novos rascunhos, desenhos de mim, que eu ainda não conhecia o traço.' Isto é lindo, encantador, adoro essa coisa de redescobrir quem somos, ou descobrir o que somos, desvendar nossos traços...A descoberta do nosso eu, dentro das nossas multiplicidades, que se revela a cada novo dia, é sem dúvida uma das maiores experiências. Se descobrir é uma das melhores coisas da vida. Porque a gente sempre tem algo mais a descobrir sobre a gente, há sempre um pedacinho nosso esperando para ser encontrado, devorado, apreciado. Porque eu acho que somos assim, feitos de pedacinhos, espalhados pela vida, por caminhos talvez pré determinados por um destino, apenas esperando a hora de nos reencontrar.

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  2. Eu posso imaginar o que você sentiu ao ouvir Gil cantando toda menina baiana tem um jeito que Deus dá... Eu também em seu lugar sentiria,acreditaria piamente que a música seria pra mim! Aliás acredito que qualquer brasileiro e baiana sentiria a mesma coisa!

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  3. oi. tudo blz? estive por aqui dando uma olhada. muito legal. apareça por la. abraços.

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