24 de junho de 2014

A Resistência Francesa e a oposição ao nazismo: quando os alemães invadiram a França em 1940, embora o governo francês tenha optado por colaborar com o III Reich, um movimento clandestino de reação foi desencadeado

Henri Philippe Pétain, militar que ganhou notoriedade na Primeira Guerra Mundial, pois se atribui à sua atuação a vitória da França sobre a Alemanha na Batalha de Verdun, foi convidado a integrar o governo francês em maio de 1940. Neste período, a Segunda Guerra Mundial já havia sido deflagrada e fazia poucos dias que as forças alemãs comandadas por Hitler tinham invadido a república francesa.

Não foi preciso muito tempo para que o marechal Pétain, uma vez fazendo parte da estrutura de governo, saísse da condição de Chefe de Combate para a de Chefe do Conselho, e desta para a de Primeiro Ministro, o que aconteceu na noite do dia 16 de junho, quando o então chefe de Estado, Paul Reynaud, por discordar da condução passiva que o poder francês vinha assumindo frente à invasão dos alemães, tornou público o seu pedido de desligamento.  

Substituição feita, no primeiro dia após a sua nomeação, dia 17, Pétain anunciou um armistício cuja assinatura aconteceria já no dia 22 seguinte, no mesmo vagão de trem, na cidade francesa de Compiègne, onde o general francês Ferdinand Foch havia definido na Primeira Guerra Mundial os moldes da rendição alemã. A escolha do mesmo lugar para a celebração do cessar-fogo foi uma exigência de Hitler, que fez questão de se sentar na mesma cadeira que antes havia sido ocupada por Foch.

Através do Segundo Armistício de Compiègne, estavam então confirmadas todas as condições para que a Terceira República, que vigorava em território francês na época, fosse dividida em Zone ocupée (Zona Ocupada), ao norte, e Zone libre (Zona Livre), ao sul, através daquela que ficou conhecida como Ligne de démarcation (Linha de Demarcação) e impôs uma severa fronteira interna no país. A separação ainda estabeleceu uma área administrativa que tomou como base a região Alsace-Lorraine.

A Zone ocupée ficou sob a orientação dos códigos do III Reich, e a Zone libre, conhecida como La France de Vichy – Vichy é uma cidade do sudeste francês onde, após o Armistício, passou a funcionar a sede do governo –, teve uma gestão administrativa que somente na fachada era francesa, pois não deixou de ser interferida pelos alemães, de modo que hoje se fala da França de Vichy como tendo sido um regime, também, subjugado aos rigores da Ocupação.

Acervo Musée de la Résistance Nationale
Mapa da França após a Ocupação

O chamado de De Gaulle
A cessão ao domínio alemão foi avaliada como impertinente e absurda por parte do general De Gaulle, antigo Secretário-Geral do Estado no governo de Reynauld, e que ao saber que um armistício tinha sido anunciado foi imediatamente a Londres solicitar aos britânicos apoio para que a França permanecesse lutando. O general entendia que “o enfrentamento aos alemães tinha que ser feito, que a guerra estava só começando e que a França não estava sozinha”.

Foi então que munido deste ideal, De Gaulle no dia 18 de junho de 1940 se dirigiu aos estúdios da Rádio BBC e, por meio de uma emissão radiofônica, convocou os franceses a fugirem da servidão, continuarem a luta e a não se renderem às forças alemãs, “pois a pátria estava em perigo e era preciso salvá-la”.

Acervo Musée de la Résistance Nationale
Chamado de Gaulle do dia 18 de junho

Composição de forças
Novos apelos seguiram ao do dia 18, de modo que a partir de Londres, De Gaulle, que esteve muito próximo de Churchill, suscitou no povo francês a necessidade de fazer frente ao nazismo e estruturar um movimento, que além de reagir à ocupação alemã, precisava se opor ao governo vigente, pois, em sua perspectiva, Pétain ao ter optado pelo armistício estava a condenar o espírito republicano.

E foi a esse combate político-militar, dotado de teor patriótico e contornos revolucionários, constituído por homens e mulheres contrários à ação de Pétain e à consequente conversão da França num país colaboracionista, que foi dado o nome de “Resistência Francesa”. O movimento ficou conhecido como “A Resistência” e aconteceu entre 1940 e 1944.

Sua elaboração, no entanto, não foi imediata. As adesões aos seus propósitos aconteceram de forma isolada e, quando seus ideais se multiplicaram em território francês, houve um considerável período de discordância entre os diferentes segmentos que se sentiram mobilizados pelas convocações feitas por De Gaulle, de modo que o consenso só emergiu após uma construção lenta e que exigiu, entre outras ações, a revisão do papel dos partidos e dos sindicatos, uma vez que estes foram dissolvidos quando a França capitulou.

Acervo Musée de la Résistance Nationale 
General Charles De Gaulle

“No que diz respeito aos partidos, as fragmentações mais sérias e que mais afetaram o andamento da Resistência foram apresentadas no âmbito do Partido Comunista Francês (PCF). Isso porque em 23 de agosto de 1939 havia sido assinado o Pacto de Não-Agressão entre a Alemanha e a União Soviética, através do qual as duas nações prometeram neutralidade mútua, caso uma delas viesse a ser invadida por algum outro país. Sendo assim, diante da invasão alemã à França, o PCF apresentou reações muito ambíguas, já que tinha um alinhamento no campo político com a URSS”, explica Laurent Védy, neto do resistente Gilbert Médéric Védy e que se tornou estudioso da Resistência.

Além disso, acrescenta ele, “o PCF estava desde setembro de 1939 com suas atividades suspensas por ordem do então chefe do governo francês, Édouard Daladier, que recorrendo a um decreto de lei assinado no dia 26 de setembro de 1939, interditou o partido tomando como motivação para esta atitude a invasão da Polônia pela União Soviética, ataque este que levou a Inglaterra e a França a declararem guerra contra a Alemanha, e assim iniciarem a Segunda Guerra Mundial”.  

A decisão de Pétain de ceder facilmente à presença da Alemanha em território francês foi levada, no dia 10 de julho de 1940, à apreciação do parlamento, onde foram registrados 569 votos a favor e 80 contra. Dessa maneira, Pétain, que a esta altura já estava em Bordéus, no sudoeste da França, para onde o governo francês fugiu desde o dia 14 de junho quando Paris foi ocupada, teve legitimada a sua iniciativa de permitir que a França contribuísse com o nazismo. 

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